5 de outubro de 2016

Crise dificulta que domésticas acessem conquistas da PEC

Os direitos conquistados pela PEC das domésticas começaram a valer de fato há um ano atrás, quando o eSocial, sistema da União que gera as guias para pagamento de INSS, FGTS e outros benefícios, começou a funcionar, em outubro de 2015. Doze meses depois, porém, as conquistas comemoradas pelas domésticas não conseguem vencer a concorrência com um mercado afetado pela crise e pelo desemprego.

Segundo última Pnad Contínua do IBGE, o contingente de trabalhadores domésticos diminuiu 2,5% entre junho e agosto deste ano. Em relação ao trimestre de março a maio, representa uma queda de 158 mil pessoas empregadas. Além disso, a pesquisa mostra que o mercado de empregos domésticos estagnou, já que na comparação com o mesmo período de 2015, o número manteve-se estável.

Em edições passadas, a Pnad apontava um crescimento do números de empregadas domésticas no país. “Esse movimento está muito ligado à queda do emprego formal. As pessoas estavam voltando para o emprego doméstico e não necessariamente para o emprego de carteira assinada, que se manteve estável nos outros trimestres do ano”, explica o coordenador de trabalho e rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, salientando que o crescimento foi entre as profissionais autônomas (as diaristas). “Mas agora, nem a informalidade está conseguindo gerar emprego”, avalia.

Vera Lúcia Araujo Santos, 42, sente essa realidade na pele. Ela ficou contratada como doméstica de outubro de 2015 até junho de 2016, quando foi demitida. “Estou com duas diárias apenas e ambas de 15 em 15 dias”, lamenta. Segundo Vera, a recolocação está difícil. “Venho procurando, em várias áreas, já perdi a conta de quantos currículos entreguei. (As pessoas) marcam com a gente, depois ligam desmarcando. Alegam que não entrou dinheiro”, diz.

A aposentada e secretária executiva Andréia Marzano Reis, 52, deixou o emprego em abril deste ano. “A empresa onde eu trabalhava convidou os aposentados a saírem e eu optei por isso”, conta. Em maio de 2016, abriu mão da doméstica que empregava desde fevereiro de 2015. “Com os aumentos dos encargos trabalhistas e minha saída do emprego, ficou pesado. Meu salário de aposentada é quase a mesma coisa que eu gastava com ela contando os encargos”, conta.

Andréia assumiu todo o trabalho doméstico. “Lavo, passo, faço a faxina. Em todo esse tempo, só chamei uma vez a faxineira. Agora que fiz uma obra, vou chamar outra vez. Mas é só de vez em quando”, diz.

Afazeres em casa são divididos
Com a necessidade de abrir mão do trabalho doméstico, as atividades estão sendo divididas. “Eu fico com as tarefas da casa, mas meu marido fica com a cozinha. Tanto fazendo a comida como limpando depois”, conta Mônica Pacheco de Andrade, 59.
Ela conta que no ano passado o seu salário já havia caído e em março desse ano ela foi dispensada. “Sou engenheira e com a crise acabei desempregada”, afirma. Com isso, dispensou a empregada doméstica e a mesma profissional passou a trabalhar como diarista em sua casa uma vez por semana. “Ela vem para mim e para a minha irmã duas vezes por semana”, diz. Para Mônica, o trabalho como diarista pode ser bom, mas “peço que ela pague o INSS, para não ficar descoberta”, diz. (LP)

LEGISLAÇÃO

Vida melhor para quem manteve emprego doméstico
Para quem conseguiu manter o emprego como doméstica, a nova legislação melhorou a vida. “O que eu mais senti foi o horário. Agora eu tenho hora para entrar e hora para sair”, afirma Viviane Pereira Silvino, 39, que trabalha como doméstica. Ela conta que antes da nova legislação, chegou a trabalhar até 12 horas em um único dia.

Para a advogada trabalhista Adriana Ribeiro Alves do Valle, as dificuldades trazidas pela crise econômica não diminuem a importância das conquistas trazidas pela PEC das domésticas. “Não é que os abusos não continuem acontecendo, a eficácia e a existência da lei são coisas diferentes. Mas pelo fato de ser uma emenda constitucional, tem um peso maior. Além disso, observo que aumentou a autoestima das domésticas que não se envergonham mais de sua atividade porque têm direitos iguais”, afirma Adriana.

A doméstica Deize Aparecida Pereira, 42, concorda. “Apesar de trabalhar nesse mercado há muitos anos e já ter carteira assinada antes, agora me sinto mais bem tratada. Com certeza minha autoestima está maior”, conta Deize.
O coordenador do IBGE, Cimar Azeredo pondera, porém, que o emprego doméstico existe em função da desigualdade social. “Em países desenvolvidos ele não existe e quanto mais desigual um país, mais emprego doméstico ele tem”, avalia. (LP)

Fonte: O Tempo

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